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sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Crítica de O Cuscuz Fedegoso

Texto de registro da apresentação do "O Cuscuz Fedegoso" / grupo Buraco do Oráculo - SP durante o X Festival de Teatro de Rua do Recife


"Uma ajuda senhor, uma ajuda senhor"... A Rua é o teatro e o Teatro é a rua - assim pensei quando entra em cena o mendigo–malandro- faminto do espetáculo "O Cuscuz Fedegoso" do grupo paulistano Buraco do Oráculo. - Eles estão falando da rua, das coisas das ruas, da vida artéria das ruas, da fome das ruas; cheiros, boca, bunda, comida, doença, morte, burla e esperteza, é o compêndio de diversidades que são as ruas.

A estética do espetáculo traz diversas construções da natureza da criação espetacular das ruas, elementos do que poderia chamar de "espetacularidade de rua". Os personagens, por exemplo, trazem em seus corpos, figurinos, trejeitos e fala, características da bufonaria. São protuberâncias, falos, erotismos, sensualidades e sexualidades, fome e desejo. Não é um tipo apenas de linhagem bufonesca, mas várias, perceptíveis na astúcia; no entanto, e acho que esse é o maior ganho do trabalho, é uma bufonaria com fazer e olhar contemporâneos.

Os bufões são seres urbanos, leva de criaturas marginais que habitam as cidades, fruto dos excrementos sócio políticos que ela produz, todavia nos projetam a visão da potência transformadora e visceral que mina da dor, exclusão e necessidades (materiais e afetivas de todos os tipos), possibilitada por que eles sublimam e mostram um mosaico de liberdades, união, eloquência e abundância de força e vida.

No espetáculo são bandos das urbes atual, espalhados entre nós, muitas vezes somos nós. Foi essa identificação talvez, que trouxe "Maria" para a cena do cuscuz. Logo no inicio do espetáculo entra em cena duas pessoas na roda, um homem e uma mulher, eles não eram do elenco, mas passaram a ser. Tanto, que não sei como o cuscuz será sem "Maria".

 O homem interagiu, brincou, divertiu-se e saiu dando adeus ao mundo dentro do outro mundo maior, porém Maria (e esse foi um nome fictício que a mesma ganhou como nova personagem do espetáculo) ela ficou e brincou, Maria trouxe e viveu seu mundo de becos, ruas, desejos, fome, erotismo e dor, compartilhando essa vivência.

Instaurou-se o caos, bendito seja o caos, no já preparado e temperado cuscuz fedegoso. Inicialmente os atores tiveram um ritual de passagem, hesitaram e temeram, pois estavam à beira do precipício que Maria escancaradamente queria lança-los, mas para nossa alegria e deleite, eles se jogaram no abismo e voaram como um bando, uns deram voos rasantes, lindos de ver, outros, mais timidamente ensaiavam suas asas abertas na aventura e imprevisibilidade que se apresenta o teatro de rua.

No cenário, alguns apetrechos e quinquilharias utilizados nas cenas, remeteram a influencia do barroco popular, misturado a plasticidade convulsiva e emaranhada do artista Bispo do Rosário. Perceptível pela deformidade, cores, arabescos, detalhes, miniaturas, colagens e fragmentos. É uma plasticidade preenchida, que enche nossos olhos, provocando atração, mas também medo e repulsa.

É um espetáculo que dialoga sobre os desejos da natureza humana, as necessidades básicas da vida - a fome, sexo, saúde, a sobrevivência e existência.  E toma para si a zombaria, ironia, escárnio, burla. Cada vez que o cuscuz se misturar as ruas, vai ficando mais apetitoso, tomando o rumo de reencontro com sua estética, podendo então mais exalar, desnudar e fazer o público deleita-se.

Um dia antes na Praça da Mustardinha, bairro do Recife, foi realizado apresentação do espetáculo, no entanto o cuscuz só "fedegou-se" na Praça do Diário, centro efervescente da capital pernambucana. Nessa apresentação entrelaçaram-se estéticas e estéticas, onde a rua com seu emaranhado de seres, imagens, força e imprevisibilidade atacou o cuscuz, temperou a seu modo e comeu até o último farelo amarelado, muitas vezes cuspindo-o de volta em outras receitas e sutilezas.


Olinda, 18 de dezembro de 2013.

Raquel Franco, Atriz e Palhaçada - Trupe Circuluz Cia de Artes.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

A última do ano


Hoje o Buraco d`Oráculo vai dar a última do ano. A última apresentação será da Ópera do Trabalho, às 18h00 no Calçadão da Rua Dom Pedro II - Guarulhos- Dentro da programação da V Mostra de Teatro de Rua de Guarulhos. 

Encerramos um ano de muito trabalho, o ano em que comemoramos 15 anos de trajetória, registrado na publicação " Buraco d`Oráculo 15 anos de História: para muito Ser Tão Ser muito mais Cuscuz" lançada em agosto. Finalizamos o projeto Narrativas de Trabalho II:Ópera do trabalho, resultando no espetáculo "Ópera do Trabalho", construído com o núcleo do grupo mais o núcleo resultado de oficinas, levando para a rua uma obras composta por 14 atores/narradores/cantores. A Ópera do Trabalho, continua sendo entoada pelas ruas, assim como também retorna ao repertório do grupo "O Cuscuz Fedegoso", espetáculo de 2002, que tem um forte significado na trajetória do grupo e agora recebe nova roupagem.
Além das estreias 2013 foi também um ano de circulações. Por meio do projeto "Ser TÃO Ser pelo sertão paulista", realizado com recursos do PROAC, seguimos pela região noroeste paulista, e pelo projeto " Ser TÃO Ser por nosso sertões", prêmio Funarte Myriam Muniz de Teatro, fomos a outra região do interior de São Paulo, Ceará, Bahia e Pernambuco. Revisitando as nossas origens, raízes, e aquilo que nos trás o espetáculo "Ser TÃO Ser - narrativas da outra margem. Ao todo foram 15 cidades, quatro estados e 28 apresentações.
Completando as andanças, participamos de importantes festivais como: VII Festival dos Inhamúns - Arneiros - CE; IV Mostra de Cenas Poéticas - Catanduva - SP; VII FESTARA - Araçatuba - SP; VIII Fentepira - Piracicaba - SP; V Mostra Olho da Rua - Santos - SP; VIII Mostra Lino Rojas - São Paulo - SP; 10º Festival de Teatro de Rua do Recife - Recife- PE e Mostra SESC de Teatro de Rua (Bauru, São Paulo, São Vicente e Sorocaba).
Por esse ano só. Agora só ano que vem, e que venha com muito mais.
Buraco d`Oráculo: Adailton Alves Teixeira, Edson Paulo, Lucelia Coelho Barbosa,Heber Humberto TeixeiraThiago ThallesRomison PauloSelma Pavanelli e Patricia Leal.
Feliz 2014!!!!